VISITA INTERPRETATIVA AOS GEOSSÍTIOS DA ILHA
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= FRUIÇÃO LIGADA À GEOCONSERVAÇÃO= --
No passado dia 29 de Julho, no âmbito do Programa Nacional “Ciência Viva no Verão”, seis elementos do CADEP-CN e o representante dos Amigos dos Açores, participaram numa visita de interpretação ambiental (vertente geológica) a alguns dos geossítios prioritários da nossa ilha, integrados no Projeto GEOPARQUE-Açores.-
Nesse passeio de autocarro, integramos um grupo de 15 pessoas (nacionais e estrangeiras), tendo a guia Dra- Joana Pombo dado a conhecer importantes geossítios da ilha, como a Praia Formosa, Barreiro da Malbusca, Ribeira do Maloás, e Poço da Pedreira, que testemunham a natureza vulcânica da ilha bem como as suas idiossincrasias geológicas, onde se incluem belas disjunções prismáticas, a presença de escoadas lávicas submarinas e um rico património paleontológico.
Ver reportagem fotográfica em: http://www.youtube.com/watch?v=Dr14_Pe9VT4
-Antes da partida houve uma breve reunião explicativa do percurso e dos elementos centrais de atenção, tendo sido ofereido aos participantes para seguimento e apetrecho teórico-informativo mais profundo o excelente livrinho OS AÇORES, ILHAS DE GEODIVERSIDADE: O CONTRIBUTO DA ILHADE SANTA MARIA, de João Carlos Nunes, Eva Almeida Lima & Sara Medeiros, Açoreana, 2007.
Tomando o que a obra informa e algumas explicação da guia, aproveitamos o ensejo para deixar aos leitores um resumo caraterizador dos geossítios visitados.
Poço da Pedreira (ou Pedreira da Cantaria)
O Poço da Pedreira é uma antiga zona de extração de inertes, mais precisamente da designada “pedra de cantaria de Santa Maria”, talhada num cone vulcânico antigo (o Pico Vermelho), constituído por piroclastos basálticos (e.g. escórias) de coloração avermelhada, muito alterados e consolidados. Atualmente, a frente de exploração apresenta paredes verticais e geométricas e, na sua base, formou-se um interessante poço.
No leito da Ribeira do Maloás, numa queda de água a cerca de 220 m da sua foz, existe um espetacular afloramento de disjunção prismática, ou colunar, numa escoada lávica basáltica com cerca de 15 a 20 m de espessura. Este afloramento é o único na ilha com estas dimensões e um dos mais belos dos Açores.
Barreiro da Malbusca/Piedade
Entre a localidade de Malbusca e a Ponta da Malbusca existe um barreiro sobranceiro à arriba, que constituiu uma antiga praia elevada do Plio- Quaternário, onde ocorrem nódulos de manganês, típicos dos fundos marinhos. Embora se trate de um elemento de paisagem de características similares ao do Barreiro da Faneca, esta zona evidencia características geológicas peculiares. De entre estas destaca-se, junto à linha de costa, a presença de uma escoada lávica basáltica com disjunção prismática, muito alterada e truncada no seu topo, o que lhe confere o aspecto de um pavimento poligonal. O grau de alteração traduz-se pela presença de disjunções esferoidais bem desenvolvidas e por material silicioso, do tipo opala, que preenche as fracturas que definem os prismas e outros interstícios da rocha (Serralheiro, 2003).
A Baía da Praia Formosa situa-se na costa Sul de Santa Maria, sendo caracterizada pela presença de depósitos de praia de areia clara, típicos desta ilha e que resultam da erosão de rochas carbonatadas. Esta famosa Praia, situada no Top tem nacional das mais belas e qualificadas, corresponde a uma baía bem recortada, semicircular, talhada por uma intensa ação erosiva marinha. A bacia de drenagem da Ribeira da Praia apresenta uma configuração grosso modo triangular, com um padrão de drenagem dendrítico, fracamente hierarquizado e os seus vales são profundamente entalhados a jusante (Madeira, 1986). Merece, ainda, nota de referência a existência, na zona dos Barreiros, na Praia Formosa, de cinzas vulcânicas cobertas por uma escoada lávica que, fruto do “cozimento” (e.g. metamorfismo termal) a que foram sujeitas, apresentam uma coloração avermelhada intensa e exibem uma disjunção colunar centimétrica perfeita pouco comum em depósitos vulcânicos deste tipo.
E porque Santa Maria é uma enorme riqueza de geodiversidade, e os geossítios não deverão ser património para ser “fechado em redomas”, mas para ser fruído pelas pessoas e fonte de mais-valias econmicas, nomeadamente na área turística, apresentámos abaixo um texto bem elucidativo dessa pespetiva, assim como o vincamento, pelos seus autores, da necessidade de uma firme proteção, a par da valorização/rentabilização, destes autênticos tesouros de Santa Maria, visando a sua sustententabilidade e perpetuação para as gerações vindouras.
“A ilha de Santa Maria evidencia uma importante multiplicidade de paisagens, de produtos vulcânicos e de rochas sedimentares que, traduzindo a história vulcânica e a evolução geológica marienses, deverão ser melhor conhecidas e, logo, devidamente valorizadas e classificadas. Estas características distintivas e peculiares devem-se, essencialmente, à idade geológica da ilha, à presença de extensos afloramentos de rochas sedimentares (incluindo calcários, calcarenitos e conglomerados) frequentemente com conteúdo fóssil abundante e diversificado e, ainda, pelo facto de corresponder à única ilha do arquipélago onde existem afloramentos de lavas em almofada (pillow lavas), abundantes e significativos.
Esta geodiversidade e os elementos de geopaisagens que caracterizam a ilha de Santa Maria são objecto de inventariação e de caracterização no presente trabalho, que, espera-se, possam constituir um instrumento de apoio à decisão, designadamente na criação de legislação específica para implementação de medidas protectoras ou de salvaguarda de locais passíveis de serem enquadrados numa perspectiva de geoconservação.
Por outro lado, os elementos agora disponibilizados contribuem para a valorização dos recursos endógenos da ilha de Santa Maria, incluindo os recursos geológicos e geoturísticos, na medida em que a identificação de sítios de interesse geológico constitui tarefa importante no âmbito do inventário da geodiversidade açoriana, da conseqüente definição de estratégias de preservação do seu património geológico e, ainda, na implementação de políticas de valorização deste património. Com efeito, esta valorização passa, nomeadamente, por uma maior consciencialização da necessidade de se compatibilizar a valorização da paisagem mariense (importante recurso turístico da ilha) no contexto de um desenvolvimento sustentável e, logo, respeitador dos valores naturais, neste caso geológicos.”
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A este texto de Carlos Nunes, Eva Almeida Lima e Sara Medeiros, no qual nos revemos inteiramente, reforçamos naturalmente, as jajidas fósseis de Santa Maria, que aliás o texto também sobreleva, vincando que tanto os geossítios já identificados (prioritários ou não) como o tesouro fossilífero mariense, SÃO PATRIMÓNIO GEOLÓGICO e não “RECURSOS GEOLÓGICOS”. Deste modo, não obstante deverem ser abertos à fruição (não extração) das pessoas e rentabilizados economicamente, essas práticas deverão obrigatoriamente estar assentes na sustentabilidade, e perdurabilidade dessas riquezas nos seus locais de origem, mantendo-as o mais intatas possível, perfilando-se códigos de conduta e procedimentos de geoconservação bem definidos e plasmados em “legislação específica”, como defendem os autores citados.
O nosso obrigado pela simpatia e explicações sábias da Joana Pombo, pelo excelente convívio e troca de experiências com todos(as), pela maravilhosa companhia do amigo de longa data José Manuel Freitas e pelo bolinho da Daniela. :)
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*José Andrade Melo
CADEP-CN e Amigos dos Açores, Sta Maria
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