CONSEQUÊNCIAS NA EROSÃO, QUEBRADAS E DESLIZAMENTO DE SOLOS
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Em Santa Maria, tal como nas
outras ilhas dos Açores, as grandes linhas de erosão e quebramento de terrenos
nas pastagens em altitude situadas no cume de colinas ou encostas declivosas,
resultaram da intensificação da agro-pecuária, nomeadamente de arroteias e
terraplanagens efetuadas em antigas áreas naturais, para a criação de pastos.
Depois das grandes arroteias, à
altura do povoamento, que destruiu grande parte do coberto vegetal primitivo,
nomeadamente a Laurissilva, houve uma certa estabilização, durante largas
décadas, tendo escapado a essa devastação arbórea os cumes das elevações e as
encostas mais íngremes. Com a adesão de
Portugal à então CEE (agora EU), surgiram os bastos incentivos e subsídios à
produção agro-pecuária, e em consequência o desbaste de outras áreas de matas,
em cotas de altitude que a prevenção, a razão e um bom ordenamento do
território, não deveriam permitir.
Pensava eu que as arroteias em
Sta Maria, uma ilha já por si parca em coberto vegetal tinham cessado, mas o
acompanhamento que fiz esta semana com um arquiteto paisagista estudioso de
Permacultura e outro amigo com sensibilidade e experiência em reabilitação
florestal, correndo a ilha “por dentro”, nos deparamos com vários desbastes de
vegetação, em lugares não recomendáveis.
As consequências dessas arroteias
em zonas de altitude, para além da degradação visível da paisagem, acarretam
outras consequências a vários níveis. A nível ecológico, pela degradação do
habitat de aves e corte de algumas espécies vegetais endémicas; a nível
hidrológico, pela falta de retenção das águas das chuvas e consequente
diminuição da recarga de nascentes; a nível geológico, pela quebra e
arrastamento dos solos.
Mesmos nalguns cortes mais
recentes, já são visíveis as quebras/deslizes de terreno e a formação de linhas
de erosão, que acabam por ser rasgos nas pastagens, de onde o solo é erodido
por ação da água, acabando por ser arrastado até às ribeiras, e destas até ao
mar.
As grandes manchas castanhas que são vistas no
mar, após grandes chuvadas, são perdas de toneladas de solo arável, que foi
escorrido, em consequência de cortes de coberto vegetal, em zonas indevidas,
terraplanagens e da total falta de derrega em pastagens e terrenos agrícolas. Defenderem
os meus acompanhantes que os controlo de arroteias e derrega de terrenos,
deveriam fazer parte do “código de boas práticas agrícolas”, tornando-os
critérios imperativos para atribuição de apoios comunitários.
Foi adiantado pelos especialistas
que “para conter a erosão nos ravinamentos ativos das linhas de erosão e
terreno posto a descoberto é preciso que o solo tenha revestimento herbáceo e
coberto arbustivo e arbóreo com raízes que consolidem o solo, evitando assim o
seu arrastamento pela ação da água.”
Recomenda-se que, para
recomposição/proteção dos espaços de cume e encostas postos descoberto pelas arroteias, há que fazer a
sua replantação, nomeadamente por espécie arbustivas e arbóreas autóctones. A
utilização de geotêxteis impregnados com sementes (entre outras técnicas) é uma
metodologia de recuperação testada já com sucesso. A derrega das pastagens já existentes, mesmo
situadas em cotas médias e baixas, também foi um imperativo vincado, no sentido
de orientar a água das chuvas para as linhas de água consolidadas, para evitar
deslizamento de terras em quebrada, como os que foram presenciados.
Nas áreas postas a descoberto vegetal é
importante o combate às espécies invasoras que têm uma ecologia que promove a
erosão, como é o caso dos silvados (Rubus
ulmifolius) e das conteiras (hedychium
gardnerianum), que ao cobrirem a luz solar, não permitem a cobertura herbácea dos solos.
Nas arroteias que verificamos,
mesmo que em quase todas elas a grande parte dos cortes tivesse sido de arbustos
infestantes, o que acontece é que o solo ficou a descoberto e sem proteção. Da
necessária proteção a fazer-se nesses cumes e terrenos declivosos, decorre uma
oportunidade de recuperação da floresta primitiva com a plantação de arbustos
nativos - folhado (Viburnum tinus ssp.
subcordatum), urze (Erica azorica)
e Uva-da-serrra (Vaccinium cylindraceum)
- nos taludes íngremes das linhas de erosão. E nos locais mais estáveis,
próximo do fundo destas linhas de erosão, são recomendadas espécies arbóreas de
pequeno porte: azevinho (Ilex azorica), pau-branco (Picconia azorica), faia-da-terra (Morella faya) e, porque não, a reintrodução do cedro-do-mato (Juniperus brevifolia), na ilha.
A recomendação de se criar
incentivos aos privados e mesmo as entidades públicas avançarem por si com
projetos de florestação paulatina de terrenos na parte Ocidental da ilha, que é
muito despida de vegetação, é um desiderato muito pertinente, que defenderemos
junto da Secretaria Regional dos Recursos Naturais.
É de louvar as recentes
plantações de árvores (algumas delas endémicas), que o Serviço Florestal de Sta
Maria tem perpetrado ao na zona alta da ilha, nomeadamente em Sto Espírito, mas
é necessária a criação de cobertos vegetais mais alargados na zona baixa, sendo
também defendida a plantação na orla das pastagens. A pequena plantação de
endémicas na encosta da subida do Pico Alto, em substituição de infestantes
arroteadas, efetuada pelo PNI-SMA, também foi enaltecida, embora seja
necessário alargar muito mais a intervenção, para que a recuperação da floresta
primitiva e a proteção do habitat de espécies animais, como a
Estrelinha-de-Santa Maria e outros, seja consequente.
Pela observação atenta da
orografia e paisagem da ilha, através de “olhos clínicos”, foi constatado que
as arroteias na ilha, para transformação de pastagens, já passaram dos limites
razoáveis e ambientalmente toleráveis, devendo os cortes de lenha, necessários
no futuro, ser sempre obrigatórios de replantação/regeneração arbustiva.
Sobre as arroteias de matas e
cortes de árvores presenciados, suscitaram-se algumas questões:
- São permitidas aos privados sem
autorização das autoridades?
- Se são autorizadas, não são
avaliados os riscos de erosão/deslizamento de solos e obrigadas medidas de
mitigação para atenuar os problemas decorrentes dessas ações?
- São identificadas/inventariadas
as espécies arbóreas e arbustivas endémicas, protegidas por lei?
- Quando os madeireiros privados
cortam árvores, não são obrigados à replantação posterior?
(Foram vistos alguns cortes de criptomérias, e
só numa zona entre Malbusca e Setadas, observámos replantações).
Quanto à qualidade das podas de
árvores nos taludes das estradas (nomeadamente dos plátanos) também mereceram
reparo, pela inestética decorrente das “mutilações” e desrespeito à fisiologia
vegetal. Aqui defendemos que, no futuro, essas podas tenham acompanhamento
especializado de técnicos dos serviços florestais
São questões pertinentes que
carecem de alguma clarificação e correção, a bem da prevenção e do tão
apregoado desenvolvimento sustentável.
* José Andrade Melo
CADEP-CN e Amigos dos Açores Sta Maria
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